Das malhas às manchas

Claudino Piletti

As manchas de óleo que invadiram as paradisíacas praias do nordeste, fizeram-me lembrar da diferença entre manchas e malhas. Enquanto malhas são marcas deixadas pela natureza na superfície dos seres para embelezá-los, manchas são marcas de sujeira deixadas pelos seres humanos na natureza.
Manchas podem ser de sujeira física ou moral. As de óleo, por exemplo, são de sujeira física. E, as de corrupção, de sujeira moral. Não raro, as de sujeira física são consequência daquelas de sujeira moral. Malhas, por sua vez, são marcas físicas deixadas pela natureza no pelo de animais, na plumagem das aves, nas asas das borboletas, no corpo de peixes e animais marinhos, nas flores, frutas, plantas e paisagens. E, também, no nosso planeta Terra.
Mas, as malhas do planeta só podem ser vistas por alguns poucos que viajam ao espaço. Os demais, cá em baixo, devem contentar-se, ou entristecer-se, com a são visão de mais manchas que de malhas. O pior é que as manchas mais perigosas nem são visíveis a olho nu. E, as visíveis, muitos fingem não vê-las.
Cito, como exemplos, as 10 milhões de toneladas de lixo plástico jogadas nos oceanos todos os anos. De 1950 para cá, a produção de plástico virgem aumentou 200 vezes. E 75% desse plástico foi descartado na natureza sem nenhuma forma de reciclagem ou reuso. Segundo cientistas, se nada mudar, até 2030 haverá espalhado em torno de 300 milhões de toneladas de plástico.
Hoje, frutos do mar, sal marinho, tudo o que vem do oceano está contaminado por manchas invisíveis. Até mesmo a água mineral de garrafinhas de plástico tem partículas de plástico. Os animais consomem essas partículas e nós as ingerimos quando nos alimentamos deles. Nem mesmo quando respiramos estamos livres delas, pois, estudos demonstraram que caem do céu como chuva. Cientistas registraram uma taxa diária de 365 partículas micro plásticas por metro quadrado nas montanhas dos Pyrineus, sul da França. Se é assim nas altas montanhas, como será em nossas cidades, estradas e praias? Não é à toa, portanto, que cientistas alertam para o fato de estarmos criando um “planeta de plástico”. Ou podemos dizer, um planeta de manchas invisíveis.
O próprio ser humano parece ter se transformado em mancha. Uma “mancha pensante”, diria o filósofo francês Pescal. Mas, geralmente, mais mancha que pensante. Tanto que está em vias de extinção por destruir sua própria casa, o belo, malhado e frágil planeta que habita.

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Postado em 13, dezembro, 2019