A Estrada dos Mil Berros
A estrada dos mil berros não é mal assombrada. É mal conservada. Por isso, os berros. O título desse texto me foi sugerido pelo seguinte fato que vivi:Já vai longe o tempo em que meu velho caseiro nhô Lourenço ofereceu-me um terreno “bem distante, mas bem barato… uma galinha morta”, disse-me ele. “E onde fica essa galinha morta?” perguntei-lhe. “Fica perto da estrada berro dois”, respondeu-me.E lá fomos nós – o caseiro, eu e meu cunhado Toninho ao volante – em busca da “galinha morta” perto da estrada berro dois. Andamos Piaí e Murundu afora e nada da berro dois.Não podia ser trote, pois, o Lourenço foi a pessoa mais correta que já conheci. Mas, como ele viera lá do sertão e jamais havia entrado numa escola, confundia arena com Helena, gênero humano com Germano e verde mar com Valdemar. Por isso perguntei-lhe se era esse mesmo o nome da estrada. Após pensar um pouco, disse que não era estrada berro dois, mas dos dois berros. Na realidade, era a BR2, descobrimos depois de muito andar. E, como ficava distante e ameaçava chover, decidimos voltar e, a aquisição da “galinha morta” foi adiada para as calendas gregas ou, para “o dia de são nunca”.Hoje, muitas das estradas do nosso país estão tão mal conservadas que, ao invés dos dois berros, são dos mil berros. Trata-se dos berros dos motoristas contra o péssimo estado de conservação das mesmas.Uma delas, pela qual transito para ir ao sítio – que não é de lazer, mas de produção -, é a estrada dos Passarinhos, que vai do bairro do Piaí ao dos Vieirinhas. Nela só se anda a mil berros por hora. Felizes os passarinhos que sabem voar e não precisam transitar por essa e outras estradas. Felizes, também, os que podem andar pela ciclovia. Nada contra a ciclovia! Mas, produtor rural, cuja ciclovia é a roça, precisa mesmo é de estrada para escoar a sua produção. E, a dos Passarinhos, apesar de ladeada por inúmeras plantações, está em péssimo estado de conservação. Tanto que, o berro dos que a percorrem, espanta os passarinhos. E, berrar, como sabemos, é com o brasileiro.O brasileiro, porém, não berra só contra o precário estado de conservação das estradas. Berra, também, contra a precária assistência médica, contra o baixo nível da educação, contra falta de segurança e contra a corrupção. E, após o vexame de 7 a 1, berra contra a seleção.Assim, seja na estrada, no estádio, na cidade ou no campo, o que o brasileiro mais faz é berrar. Mas, como dizem os gaúchos, brasileiro é que nem cabrito embarcado. Vai berrando, mas vai.
Claudino Piletti