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Violência contra a mulher: realidade ou exagero?

Condenado em primeira instância pela Justiça italiana por violência sexual ocorrida em 2013, o jogador de futebol brasileiro Robinho, quando soube da investigação na época, afirmou “[…] não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”. Recentemente, depois da repercussão do caso na mídia nacional e na sua contratação pelo Santos, o jogador criticou “Infelizmente, existe esse movimento feminista. Muitas mulheres, às vezes, não são nem mulheres […]”. Como interpretar estas afirmações?
Para a jornalista Cristina Serra (FSP, 19/10/2020) tais declarações exemplificam a cultura do estupro, reforçada historicamente com discursos de pessoas famosas e de representantes políticos. Exemplifica com a afirmação de Paulo Maluf, então candidato à presidência em 1989, que disse “O que fazer com um camarada que estuprou uma moça e matou? […] Tá com vontade sexual, estupra, mas não mata!”. Da mesma forma, o presidente Jair Bolsonaro, por ordem judicial, foi obrigado a pedir desculpas a deputada Maria do Rosário por ter dito em 2014, que ela não merecia ser estuprada porque a considera “muito feia” e não faz o “tipo” dele.
Embora visíveis avanços nas políticas públicas e nas legislações que buscam coibir e a violência contra a mulher, os dados revelam que há muito a melhorar. A quantidade de denúncias de violência contra as mulheres recebidas no canal 180 cresceu quase 40% entre abril de 2020 e 2019, de acordo com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (VEJA Saúde, 12/07/2020). Reflexo da pandemia da COVID-19, o confinamento agravou a situação das mulheres que vivem no contexto da violência doméstica. O anseio ao combate da violência contra a mulher também foi tema da primeira temporada da série brasileira “Bom dia Verônica”, retratando os abusos e a dificuldade de romper com o silêncio e com o ciclo da violência doméstica.
Por fim, enquanto a realidade dos números for tratada como exagero e os discursos de desprezo e ironia servirem para justificar a violência, certamente as barreiras para romper a cultura do estupro serão cada vez mais altas.

Ana Cristina Piletti

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