“Tão perto, tão longe”
Em 1968, a cidade de Ibiúna sediou o 30 º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). Cabe lembrar que o evento, na época, proibido pelo regime militar, resultou na prisão de mais de 700 líderes estudantis. Ao mesmo tempo, tornou-se um símbolo de resistência à ditadura. Com princípios nobres, como a defesa pela liberdade de expressão e pelas práticas democráticas, os fatos do Congresso, até hoje, são discutidos na academia, na política e na sociedade. Embora o tema traga a possibilidade de diversas discussões políticas e ideológicas, o objetivo deste texto será refletir sobre o sentido do Congresso no local em que ele ocorreu, ou seja, na cidade de Ibiúna. Um evento que conquista tamanha repercussão nacional, localmente pode ser desconhecido e insignificante? A reposta esperada é não. Ou seja, quando acontece algo em “nosso quintal”, dificilmente não percebemos ou não ficamos sabendo. No entanto, nem sempre é assim. Não percebemos ou não nos interessamos por algo que acontece em nosso “quintal” quando “não é da nossa conta”, isto é, “não participamos” e “não vemos sentido” no que está ocorrendo. Em Ibiúna, por exemplo, apenas após 42 anos foi construído um memorial em homenagem aos presos do Congresso. Enquanto algumas pessoas preocupam-se com o valor histórico deste evento, muitos, provavelmente, desconhecem ou não consideram tal fato tão relevante para ser vangloriado. Com certeza, as duas posturas são compreensíveis. Aqueles que cultivam a nostalgia deste marcante evento de 1968 tentam resgatar as memórias desta época e mostrar para o povo que é impossível não valorizar o que aconteceu em “nosso quintal”. Já, para aqueles que desconhecem ou não veem grande significado do fato para a cidade, não se percebe como sujeito desta história, afinal, praticamente todos que aqui estavam no Congresso, daqui não eram.Assim, é possível que algo esteja tão perto e ao mesmo tempo tão longe. A distância está no sentimento de pertença. Metaforicamente, o maravilhoso verso de Fernando Pessoa/ Alberto Caeiro retrata a dificuldade e a necessidade de fazer florescer este sentimento em cada pessoa que por aqui viveu e viverá ou que por aqui passou ou passará: ”O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia, Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia/ Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.(…) O rio da minha aldeia não faz pensar em nada/ Quem está ao pé dele está só ao pé dele.”