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Seria eu um legislador melhor?

Ana Piletti

Imagine, por um momento, que, cansado dos escândalos de corrupção diariamente noticiados sobre a política, você resolve se candidatar a deputado federal. E melhor, você venceu a disputa, e iniciará seu mandato em 2019! Você seria um legislador melhor do que os que atualmente temos?
Inicialmente, você precisaria de assessores de confiança. Selecionaria uma equipe competente ou contrataria alguns amigos de longa data, ou ainda, pessoas apenas porque ajudaram você a se eleger? Tendo formado uma equipe boa, segue outra pergunta: quais projetos você escolheria para defender, programas que podem beneficiar aqueles que votaram em você, tais como grupos de empresários, uma determinada comunidade religiosa, ou trabalharia em algo que beneficiasse o país como um todo? E ainda, para conseguir aprovação de suas propostas, você votaria em projetos de outros candidatos que são um pouco “mais suspeitos” ou você correria o risco de passar seus quatro anos de mandato sem aprovar nenhum projeto?
Este teste é bastante útil porque, dependendo das respostas a estas perguntas, já fica fácil saber se, após seus quatro anos mandato, você seria um político diferente daqueles que diariamente criticamos! Mais ainda, a partir dele, também podemos saber se você teria feito “amigos” e angariado recursos para se reeleger em 2022, ou se contaria com apenas sua imaginação para fazer do nosso Congresso um lugar melhor.
Humberto Dantas (Estadão, 12/06/2016), apresentou os resultados de uma pesquisa realizada com dois mil estudantes do ensino médio, na qual constatou que 43% deles concordavam com a frase “legisladores devem realizar favores para os seus eleitores”. Relatou ainda o caso do “leilão do paraninfo”, contado por um vereador durante uma de suas palestras. Numa determinada cidade do interior, às vésperas da formatura, alunos de uma escola pública passavam pelos gabinetes dos vereadores vendo quem poderia dar a maior contribuição para a festa em troca da homenagem. Neste caso, os alunos se beneficiavam com o farto evento patrocinado e o vereador com o espaço privilegiado no palco da festa para discursar para futuros eleitores e seus familiares. Se ambos saem ganhando, que mal tem nisso?
Aí é que mora o perigo! É justamente neste hábito do apadrinhamento, realizado de forma quase que natural no nosso cotidiano, que se reproduz a cultura da hipocrisia e se alimenta o mecanismo de corrupção. Afinal, qual seria a real função dos legisladores? Garantir a democracia ou perpetuar o personalismo? Em nome da coletividade, criar leis e fiscalizar o poder executivo ou, em nome da amizade, aprovar projetos para negociar cargos? E, em meio a todas estas reflexões, a mais importante: Qual destas duas realidades estamos ajudando a construir?

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