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Crise democrática na Venezuela: impactos internacionais e o papel do Brasil

Ana Cristina Piletti

A crise democrática na Venezuela continua a impactar a política internacional, especialmente após as recentes eleições presidenciais em 28 de julho de 2024. O Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela declarou Nicolás Maduro como vencedor com 51,2% dos votos, enquanto o opositor Edmundo González teria obtido 44,2%. A oposição, no entanto, alega fraude e afirma que González venceu com 70% dos votos (G1, 04/04/2024). Afinal, o que realmente está em jogo nessa disputa?
A Venezuela conta com o voto eletrônico e a impressão do voto em papel permitindo a verificação cruzada. No entanto, a alegação de fraude e a ausência da divulgação das atas eleitorais com o registro dos votos colocam esse sistema sob questionamento e abalam a credibilidade internacional da região. Diversos países têm reagido ao impasse. A Argentina, por exemplo, reconheceu o opositor como presidente eleito, acompanhada por Estados Unidos, Chile e Uruguai, que exigem uma auditoria independente. Por outro lado, Bolívia, Honduras, Nicarágua e potências como Rússia e China reconheceram a vitória de Maduro.
Rafael Villa, professor de Ciência Política da Universidade de São Paulo, argumenta que “a recontagem imparcial das atas seria essencial para estabilizar a situação no país” (Jornal da Usp, 29/07/2024). Por sua vez, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos destaca que a pressão internacional frequentemente esconde interesses geopolíticos, como o controle dos recursos naturais da Venezuela (Viomun-do, 03/08/2024).
O Brasil tem adotado uma postura ambígua. O presidente Lula (PT) pediu transparência e a apresentação das atas eleitorais antes de tomar uma posição definitiva sobre o reconhecimento do resultado. Ao mesmo tempo, fez declarações que minimizam as suspeitas de fraude. Apesar do histórico de aliança com Maduro, as denúncias de falta de transparência e a perseguição à oposição venezuelana têm complicado essa relação. Contudo, ao hesitar em se posicionar, não estaria o Brasil comprometendo sua credibilidade como líder regional em defesa da democracia e dos direitos humanos?
Esta situação pode ser comparada à fábula “O Rato e a Ratoeira”, onde os outros animais ignoram o aviso do rato sobre o perigo até que enfrentam as conse-quências. Ao agir com prudência e insistir na transparência, o Brasil pode evitar as armadilhas da ditadura e garantir que a democracia prevaleça. No entanto, a reflexão mais profunda deve ser: ao defender a lisura no processo eleitoral da Venezuela, o Brasil não estaria também protegendo seus próprios valores democráticos e evitando futuros riscos à sua própria estabilidade?

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