Somos todos caminhoneiros?
Nos últimos dias, o Brasil literalmente parou. Desta vez, não por conta da Copa do Mundo, mas sim pela paralisação dos caminhoneiros. Desabastecimento de combustível, falta de produtos nos supermercados e no comércio, indústrias paradas e prejuízos na agricultura e pecuária. Um custo imediato de 60 bilhões de reais para a economia do país (VEJA, 01/06/2018). No entanto, mesmo diante dos transtornos causados, 87% dos brasileiros apoiavam o movimento, segundo pesquisa realizada pelo Datafolha (30/05/2018). O que explica tal contradição?
Segundo reportagem publicada no jornal espanhol El País (01/06/2018), mais do que uma greve, “foi uma catarse coletiva, uma válvula de escape para todas as críticas acumuladas pelos cidadãos contra os governantes, contra a corrupção crônica dos políticos, vista como uma peste nacional”. Além de expor a fragilidade, impopularidade e falta de habilidade de negociação do atual governo, o evento revelou a falta de confiança da população nas lideranças políticas do país.
Apura-se ainda se o movimento teve o apoio de grandes empresários do setor de transporte e se grupos políticos infiltrados aproveitaram-se da mobilização para promover o caos e dificultar o fim da paralisação. Em meio às manifestações deste período, exibiam-se mensagens como “Fora Temer”; “Volta Lula”; “Intervenção Já”; “Somos todos caminhoneiros” entre outras. De um lado, percebeu-se que a insatisfação da população é geral e, neste ponto, estão todos unidos. Do outro, verificou-se a eclosão de discursos e posicionamentos extremistas e, neste aspecto, cada grupo preocupa-se somente com seus próprios interesses.
Logo, devemos ter cuidado para que as crises vivenciadas em uma democracia não sirvam de pretexto para um retrocesso na história das conquistas dos direitos fundamentais. Afinal, “a democracia é o único caminho legítimo” segundo a presidente do Supremo Tribunal Federal Carmem Lúcia. Para ela, “há de se ter seriedade e também manter a esperança. Há de se cuidar dos direitos e também garantir os serviços e o incansável combate à corrupção. Não vivemos de quimeras, embora lutemos por sonhos” (Estadão, 30/05/2018).